segunda-feira, 11 de maio de 2009

Política em Verso (18) - Zezão - 03-01-1924.

Perguntou-me o Director
Da nossa «Acção Social»
O motivo ou a razão,
Ou seja lá o que for
Do meu silêncio: então
Que tem você, seu Zezão…

Por vergonha não lhe disse
O que cá dentro sentia
E procurei-lhe ocultar
A minha grande perrice
E um sorrisinho alvar
Que me ficou a matar!

Mas a ti leitor amigo,
Se me prometes segredo,
Vou te abrir o coração
E tu vais chamar um figo
À bela da explicação,
Do silêncio do Zezão.

Se na semana passada,
Nada escrevi para o jornal
Foi por ‘star constantemente
À espera da consoada
Do meu leitor, que afinal
Deu em droga, deu em nada…

Ao ouvir bater à porta,
P’ra lá deitava a correr,
Mas, por mal dos meus pecados,
Ficava co’a cara torta,
Pois sempre via aparecer
Alguns credores irritados.

Sempre à espera – que arrelia,
Sem noutra cousa pensar,
Desde manhã, muito cedo,
Tè à noute, todo o dia…
E ficar sempre a chuchar…
Ficar a chuchar no dedo!...

Desespero torturante,
Co’a alma assim tão atada,
Como podia eu ‘screver?
Nem no Inferno de Dante
Se vê lá explicada
Pena, assim, um tal sofrer!

No meio disto, porém,
Sempre um conforto encontrei
P’ra as minhas penas dobradas,
Pois além de beber bem
E com gana me atirei
Às belas das rabanadas!

E aos mechidos e às filhós
E ao polvo e à batatada
E das trouchas tão tenrinhas…
Ai filhós! Aqui para nós,
Fiquei com a barriga inchada
E na cabeça… uns grilinhos…

É que a nossa pena e mágoa
Nunca se afogam com… água!
Zezão