quarta-feira, 2 de janeiro de 2008

O COUTO DE TIBÃES (1)

No Boletim da Biblioteca e Arquivo Distrital de Braga, II volume, pág। 16, lê-se a transcrição de um documento que diz «…o pequeno Couto de Tibães, (foi) doado aos Monges Beneditinos pelo Conde Dom Henrique e Dona Teresa em 24 de Março de 1110 …», «por amor de Deus e de Pedro Pais (Escacha) e Paio Pais, filhos de Dom Payo Guterres da Sylva que sempre nos sérvio com grande sayisfação».
Este facto significa que o Mosteiro e a sua terra coutada fica imune, ou seja, o senhorio é exclusivo dos Monges de S. Bento. A existência de um couto trazia um conjunto de benefícios:
- Os limites do couto, definidos por marcos de pedra, pela orografia e linhas de água, impediam a entrada dos funcionários régios (juízes, meirinhos e mordomos);
- os seus moradores estavam isentos de cumprir serviço militar no exército do rei;
- os moradores estavam isentos de pagar multas ou imposto braçal ou pecuniário ao fisco;
- era de sua livre nomeação os juízes ordinários quer do cível, quer do crime e nomeavam, também, o capitão das ordenanças e demais funcionários do couto.
Quando os Cavaleiros da Reconquista aqui ergueram o seu cenóbio, os condes D. Teresa e D. Henrique, reconhecendo a sua importância, outorgaram-lhe a Carta de Couto aos 8 das Kalendas de Abril (25 de Março) da era de 1148 (ano de 1110). O Convento era detentor de grandes poderes, doações, senhor de bens e vastas propriedades, que se estendiam entre os Rios Cávado e o Minho. Os Pais do nosso primeiro rei coutaram o mosteiro e a sua cerca nestes termos: «Por amor de Deus e de D. Pedro Paes e Payo Paes, filhos de D. Payo Guterres, que sempre nos serviu com grande satisfação...».
D. Afonso Henriques confirmou essa concessão da carta de couto, em 1135, reunindo-lhe o Lugar de Donim, junto do Rio Ave, logo a seguir, uma vez que Mendo Bofino vendera, em 1161, por 25 maravediz as suas propriedades no Lugar da Estela, D. Afonso Henriques anexou ao Mosteiro de Tibães, na era de 1178 (ano de 1140) o Couto de Mendo ou de Santa Maria da Estela e, mais tarde, o antigo Couto de Vimieiro.
A partir de então o Mosteiro de Tibães, ou os seus monges, passaram a ter uma grande influência não só no seu couto como até em toda a zona do nascente Condado Portucalense, fomentando a agricultura e por arrastamento a revolução hidráulica com o aproveitamento da força da água dos rios e ribeiros, numerosos na região, que faziam movimentar as azenhas, serrações e lagares de azeite.
Com os rendimentos que passaram a obter, de certo que principiaram por restaurar as ruínas do antigo cenóbio visigótico que, talvez tivesse sido destruído não só pelas sevícias do tempo, como pelas invasões sarracenas, que em pleno século VIII tudo devastaram e levaram à sua frente.
Em 21 de Agosto de 1105, verifica-se uma permuta de terras entre D. Nuno, Abade de Tibães e S. Geraldo, Arcebispo de Braga e, em 1189 (ano de 1154) Pelágio Soares vendeu por 4 maravediz tudo o que possuía (uma quinta rural na Vila de Palmeira).
Pelas inquirições de D. Afonso II (1220), no que se refere aos bens das ordens monásticas, verifica-se que Tibães era detentora de um enorme conjunto de bens: uma quinta, 236 casais espalhados por 48 freguesias (do termo de Guimarães, Terras de Bouro, Penafiel de Bastuço, Prado, Neiva, Faria, Vermoim e Braga).
Em 1220 eram Igrejas do Mosteiro, as de S. Martinho de Tibães, de Santo Adrião de Padim da Graça, São Salvador de Reguela (Pousa), São Paio de Parada e Santa Maria de Panóias. Ao Couto de Tibães pertenciam as seguintes paróquias: Santo Adrião de Padim da Graça, Santa Maria do Couto de Tibães (Panoias), São Paio de Parada, S. Martinho de Tibães, Santa Maria de Mire (Senhora do Ó), São Paio de Merelim.
D. Diniz isentou os moradores do couto, em 1334, de irem ao seu serviço e mandamento ( como todos os do seu reino eram obrigados), exceptuando os que tivessem herdades fora do dito couto.
El-Rei D. Fernando, em 5 de Agosto de 1372, estando em Braga, confirmou ao D. Abade de S. Martinho de Tibães, beneditino, os seus privilégios, usos e bons costumes.
Estando D. Afonso V em Évora, no ano de 1444, isentou do trabalho os moradores deste couto, em relação às obras de barbacans da cidade de Braga, tendo nisso atenção aos seus privilégios e a pagarem anualmente 36 soldos brancos para as ditas obras.
El-Rei D. Manuel deu-lhe foral em 4 de Setembro de 1517 (Livro dos Foraes Novos do Minho, fl. 143, col.1ª), em vista do que se acha em Francisco Nunes Franquelim, na sua Memoria para servir d’indice dos foraes do reino e seus dominios, p. 147 .
D. Filipe II de Espanha e I de Portugal, confirmou este contrato, em 1582, no Dom Abade Frei Plácido de Vilalobos, natural de Lisboa, que já havia governado o Mosteiro por ordem do Cardeal D. Henrique, desde 1565 até 22 de Julho de 1569.
Ao redor do mosteiro, até aos limites da freguesia, os terrenos eram grangeados pelos monges, criados e feitores, os outros eram trabalhados pelos caseiros, mediante o pagamento de foros, rendas e pensões sobre o usufruto das terras. Do primeiro caso faziam parte, além da cerca do mosteiro, as quintas da Amieira, do Anjo, do Pedroso e de Mire. Esta última, aonde se fizeram as casas e benfeitorias, em 1623, gozava de especial predilecção. Era estância de repouso e recreio dos religiosos. O Livro das Alfayas de todas Oficinas e Quintas deste Mosteiro de S. Martinho de Tibaens feito no anno de 1750, descreve-a do seguinte modo: «É esta toda cercada de muros. Tem a sua entrada ao sul com seu pórtico de pedra e assentos do mesmo e pelo lado oriental uma fonte que se divide em dois registos de água, uma para dentro com sua taça e bocal de bronze e outra para a estrada com seu nicho e cano de ferro. Esta água tem sua nascente no Seixido, do qual vem por baixo da terra em aquedutos de barro».
O mosteiro detinha a posse total de toda a água do Rio Torto que regava as Veigas do Sobrado e Argaçal, através de uma levada , mandada construir em 1624. Pelo uso dos regos de Mire, pagava-se em 1635, 35 alqueires de milho e centeio e 11 alqueires de milho. Para além do seu papel de irrigação, as águas do Rio Torto faziam andar os moinhos, propriedade do mosteiro, de Panóias (Penelas e Pontesinhas) e de Mire (os de Sobrado).
Braamcamp Freire («Povoação d’Entre Doiro e Minho no XVI século», Archivo Historico Portuguez, III, (1905), p. 263) descreve a contagem de fogos, em 1527, determinada por D. João III: «Este couto é do Mosteiro de Tibães, o cível e o crime del-Rei nosso Senhor e tem de termo dentro de si meia légua e jaz entre os termos de Barcelos e o de Braga e o de Prado e corre o Rio Cávado ao longo dele entre Prado e o Couto e não tem povoação nenhuma junta somente por casais apartados vivem os moradores seguintes nestas freguesias, S. paio de Merelim, 38 moradores, Santa Maria de Panoias, 21, S. Paio de Parada, 17, Santa Maria de Mire, 28, Santo Adrião e o Mosteiro, 22 moradores. Somam os moradores deste couto por todos os fogos 126 moradores. Item haverá mancebos homens solteiros, 90 mancebos».
O crescimento patrimonial do mosteiro é perfeitamente constatável nos registos, tombos de 1528,1555 e, outros, livros de prazos, vedorias, recibos e sentenças.
A importância de algumas freguesias que pertenciam ao couto de Tibães:
- a freguesia da Estela é uma das terras mais antigas do concelho da Póvoa de Varzim. Foi pertença do conde Dom Mem Pais Boufinho, descendente de Azevedos e também do senhor de Vila do Conde, o qual, com seu filho Hermenegildo, venderam a freguesia da Estela a Dom Mendo III Abade de Tibães. D. Afonso Henriques, em 1140 a coutou a Dom Ordonho IV, abade de S. Martinho de Tibães e a seus religiosos por 600 alqueires de pão. A carta de couto da freguesia de Santa Maria da Estela, concedida por D. Afonso Henriques em 7 de Julho de 1140 ao referido convento de Tibães, é o documento original mais antigo até agora encontrado em que o primeiro monarca português emprega o título de Rei de Portugal. Esta carta encontra-se na torre do Tombo em Lisboa, e é elemento preciosíssimo para a história desta freguesia. A freguesia da Estela desde a concessão desta carta de couto até ao ano de 1834, data da extinção das Ordens Religiosas, em Portugal, por Joaquim António de Aguiar (mata frades), esteve na independência do Mosteiro de Tibães, o qual dela recebia todos os anos boa parte da respectiva produção agrícola. O lugar de Vila Mendo, nome pela qual foi conhecida a freguesia da Estela, durante algum tempo Villa Menendi, é muito conhecido por ali se terem encontrado importantes peças arqueológicas da época pré-romana. Elas foram o chamado “tesouro” da Estela, que no momento, está depositado no Museu Soares dos Reis. É constituído por um colar de ouro, duas arrecadas e parte partem dum torquês do mesmo metal e fragmentos de ouro e prata;
- assim, é apenas em 1220 que aparece a designação de S. Paio de Merelim. Lê-se nas inquirições de D. Afonso II o seguinte: "De Saneto Pelágio de Merlin de Couto de Tibães". Encontramos duas designações novas: S. Paio e Couto de Tibães. Pois bem, S. Paio é o Padroeiro mártir natural de Tui-Espanha, que foi martirizado com 13 anos de idade no ano de 925 por ordem do Califa de Córdova. A sua fama de mártir expandiu-se e a população de Merelim tornou-o seu Padroeiro;
- Panóias era uma freguesia importantíssima no Couto de Tibães no séc.XVI, porque era muito forte em relação à agricultura. Também tinha moinhos junto ao rio e azenhas para produzir o azeite, os moinhos produziam a farinha, as terras eram férteis porque tinham o rio perto, para se poder irrigar os campos.